quinta-feira, 31 de maio de 2007

Não Publicar

A Polícia de Pelotas tem uma estranha e perigosa mania. Coloca em alguns boletins de ocorrência o carimbo "Não Publicar". Isso é facilmente comprovável - basta ir a qualquer delegacia e pedir para ver os BOs. É claro que essa atitude é deslocada da realidade - o próprio ouvidor da Polícia, em entrevista-consulta ao Diário Popular condena o carimbo e a atitude. Ela, na prática, não existe e garanto, é motivo de piada em São Paulo. É uma tentativa canhestra de censurar algo que é público. Para quem não sabe: boletim de ocorrência é um documento público, de acesso franqueado a quem quer que seja. Naturalmente, o uso das informações é de inteira responsabilidade de quem as publica - existem normas que protegem crianças e vítimas, como, por exemplo, a preservação de seus nomes e endereços. Não é um policial que vai censurar o que deve ser publicado ou não. Para quem quiser saber como a coisa toda funciona - inclusive advogados que tomam essa regra esdrúxula inventada pela Polícia como norma pétrea - basta uma consulta à Constituição Federal. O artigo é o 5º, e o inciso é o XXXIII. Veja, logo abaixo, o que diz a Lei 11.111/2005, que regulamenta o Inciso XXXIII (veja especialmente o artigo 2º - O acesso aos documentos públicos de interesse particular ou de interesse coletivo ou geral será ressalvado exclusivamente nas hipóteses em que o sigilo seja ou permaneça imprescindível à segurança da sociedade e do Estado, nos termos do disposto na parte final do inciso XXXIII do caput do art. 5º da Constituição Federal). Na prática, qualquer ocorrência poderá ser noticiada - a não ser, é claro, que a manutenção de seu sigilo seja de interesse nacional. A queixa de uma mulher agredida pelo marido que ocupa lugar de destaque na sociedade, por exemplo, está muito longe de ser assunto de segurança nacional. Um acidente de automóvel também não. Um assaltante, preso em flagrante, pode exigir que sua prisão não seja noticiada? Evidentemente que não. Nem ele e nem a Polícia. Portanto, jornalistas pelotenses, não se intimidem diante de um carimbo. Este do qual falamos não vale nada.

Veja o que diz a Constituição Federal
TÍTULO II
Dos Direitos e Garantias Fundamentais
CAPÍTULO I
DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
...
XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;

Veja agora a regulamentação do inciso XXXIII

Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI Nº 11.111, DE 5 DE MAIO DE 2005.
Conversão da MPv nº 228, de 2004

Regulamenta a parte final do disposto no inciso XXXIII do caput do art. 5º da Constituição Federal e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º Esta Lei regulamenta a parte final do disposto no inciso XXXIII do caput do art. 5o da Constituição Federal.

Art. 2º O acesso aos documentos públicos de interesse particular ou de interesse coletivo ou geral será ressalvado exclusivamente nas hipóteses em que o sigilo seja ou permaneça imprescindível à segurança da sociedade e do Estado, nos termos do disposto na parte final do inciso XXXIII do caput do art. 5º da Constituição Federal.

Art. 3º Os documentos públicos que contenham informações cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado poderão ser classificados no mais alto grau de sigilo, conforme regulamento.

Art. 4º O Poder Executivo instituirá, no âmbito da Casa Civil da Presidência da República, Comissão de Averiguação e Análise de Informações Sigilosas, com a finalidade de decidir sobre a aplicação da ressalva ao acesso de documentos, em conformidade com o disposto nos parágrafos do art. 6º desta Lei.

Art. 5º Os Poderes Legislativo e Judiciário, o Ministério Público da União e o Tribunal de Contas da União disciplinarão internamente sobre a necessidade de manutenção da proteção das informações por eles produzidas, cujo sigilo seja imprescindível à segurançaa da sociedade e do Estado, bem como a possibilidade de seu acesso quando cessar essa necessidade, observada a Lei no 8.159, de 8 de janeiro de 1991, e o disposto nesta Lei.

Art. 6º O acesso aos documentos públicos classificados no mais alto grau de sigilo poderá ser restringido pelo prazo e prorrogação previstos no § 2º do art. 23 da Lei no 8.159, de 8 de janeiro de 1991.

§ 1º Vencido o prazo ou sua prorrogação de que trata o caput deste artigo, os documentos classificados no mais alto grau de sigilo tornar-se-ão de acesso público.

§ 2º Antes de expirada a prorrogação do prazo de que trata o caput deste artigo, a autoridade competente para a classificação do documento no mais alto grau de sigilo poderá provocar, de modo justificado, a manifestação da Comissão de Averiguação e Análise de Informações Sigilosas para que avalie se o acesso ao documento ameaçará a soberania, a integridade territorial nacional ou as relações internacionais do País, caso em que a Comissão poderá manter a permanência da ressalva ao acesso do documento pelo tempo que estipular.

§ 3ºo Qualquer pessoa que demonstre possuir efetivo interesse poderá provocar, no momento que lhe convier, a manifestação da Comissão de Averiguação e Análise de Informações Sigilosas para que reveja a decisão de ressalva a acesso de documento público classificado no mais alto grau de sigilo.

§ 4º Na hipótese a que se refere o § 3º deste artigo, a Comissão de Averiguação e Análise de Informações Sigilosas decidirá pela:

I - autorização de acesso livre ou condicionado ao documento; ou

II - permanência da ressalva ao seu acesso.

Art. 7º Os documentos públicos que contenham informações relacionadas à intimidade, vida privada, honra e imagem de pessoas, e que sejam ou venham a ser de livre acesso poderão ser franqueados por meio de certidão ou cópia do documento, que expurgue ou oculte a parte sobre a qual recai o disposto no inciso X do caput do art. 5º da Constituição Federal. (X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação);

Parágrafo Único. As informações sobre as quais recai o disposto no inciso X do caput do art. 5o da Constituição Federal terão o seu acesso restrito à pessoa diretamente interessada ou, em se tratando de morto ou ausente, ao seu cônjuge, ascendentes ou descendentes, no prazo de que trata o § 3o do art. 23 da Lei no 8.159, de 8 de janeiro de 1991.

Art. 8º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 5 de maio de 2005; 184º da Independência e 117º da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Marcio Thomaz Bastos
José Dirceu de Oliveira e Silva
Jorge Armando Felix
Álvaro Augusto Ribeiro Costa

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