domingo, 13 de maio de 2007

Escândalo

Reportagem do jornalista Álvaro Guimarães publicada domingo no Diário Popular de Pelotas (e republicada abaixo na íntegra) retrata o grau do escândalo que ronda a UFPel. O reitor César Borges deve explicar essa suposta facilidade de se adquirir diplomas na universidade que dirige e fazer uma varredura nos diplomas emitidos pela entidade - antes que a Justiça o faça. Sua assessoria de Imprensa, por intermédio do sr. Clayton Rocha, deve dar transparência necessária ao episódio que, confirmado, mancha definitivamente essa desastrosa gestão de uma universidade que já foi uma das mais importantes do país. Veja a reportagem e confira a gravidade do assunto:

Um diploma de Direito por R$ 2 mil
Álvaro Guimarães
Com quatro e-mails, um telefonema e R$ 2 mil é possível comprar um diploma de algumas das mais importantes universidades do Rio Grande do Sul, entre as quais a Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Ao menos é o que promete uma quadrilha com base em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, e que anuncia seus serviços através de e-mails enviados aleatoriamente de Norte a Sul do Brasil. Depois de receber um e-mail que oferecia diplomas superiores e do Ensino Médio em 15 dias, o Diário Popular fez contato com a quadrilha e deu início à negociação para compra de um diploma do curso de Direito. Menos de uma hora após ter enviado o primeiro e-mail para o endereço dip2007@zipmail.com.br, a reportagem recebeu a resposta assinada por um homem que se identificou como Gustavo. Nas 59 linhas da correspondência eletrônica o negociante - que escreveu sempre no plural - afirmou trabalhar com universidades de todo o País e que “nosso trabalho é 100% oficial, uma vez que trabalhamos diretamente com funcionários das secretarias e dos cargos de direção”. De acordo com o membro da quadrilha, os diplomas seriam confeccionados e homologados dentro das secretarias da instituição de Ensino Superior escolhida e, posteriormente, enviados ao Ministério da Educação (MEC) para homologação final. “É quente mesmo; tem até o RA (número do Registro Acadêmico). Você pode ligar lá na faculdade e teu nome vai estar lá”, garantiu.
PAGOU, LEVOU
O andamento do “serviço” está diretamente atrelado ao pagamento de 50% do valor cobrado, que no caso de um diploma de curso superior acompanhado de histórico é de R$ 2 mil. Para o certificado de conclusão do Ensino Médio o preço cai para R$ 600,00. “Normalmente fechamos o pagamento em 50% como sinal, que será usado para pagar as custas dos procedimentos (condição, homologação e envio), além das custas com os nossos colaboradores. Todos esses valores devem ser pagos, por nós, à vista e em dinheiro”, informou. O restante do pagamento deve ser feito no recebimento do diploma, que ocorreria no máximo em 15 dias. “Tenho certeza de que você entende a nossa posição, uma vez que nesse ramo é impossível zerar os riscos de ambos os lados, então julgamos justo fazermos uma divisão igualitária do mesmo”, justificou.
A ESCOLHA DO PRODUTO
As possibilidades oferecidas pela quadrilha aos clientes são vastas. Os interessados podem escolher desde cursos como Direito, Veterinária, Agronomia, Turismo e Engenharia, além das datas de início e conclusão do curso, e até a média ponderada que deseja ter no histórico. Com a intenção de medir a possível abrangência da quadrilha no sul do Estado, a reportagem solicitou um diploma do curso de Direito. Em uma primeira resposta, o negociante ofertou um diploma da Pontifícia Universidade Católica (PUC/RS), de Porto Alegre. Ao ser informado do interesse em um diploma da região Pelotas-Rio Grande, Gustavo escreveu: “Então sugiro a única outra que teria, que seria a UFPel, Universidade Federal de Pelotas.”
“Ética e segurança”
Depois de chegar a um acordo com relação ao “produto” desejado, a reportagem manteve um contato telefônico com o negociante (veja quadro). Durante uma conversa de aproximadamente cinco minutos, Gustavo garantiu a “qualidade” do diploma e o prazo de entrega, mas se negou a enviar por e-mail uma amostra do trabalho. “Não te mando uma prova pelo seguinte: é só para os clientes, eu não guardo nada porque seria antiético da minha parte; imagina amanhã ou depois eu mandar teu diploma como amostra para uma outra pessoa”, justificou. Sobre a segurança em receber a encomenda, o negociante disse: “A sua segurança estará no fato de querermos fechar esse negócio e recebermos o restante do valor, além de querermos que nossos clientes indiquem amigos e conhecidos seus, aumentando nosso movimento e lucro. Estamos há mais de cinco anos no mercado porque temos essa política de qualidade e atendimento.”Para garantir a compra e a entrega do diploma do curso de Direito da UFPel a reportagem deveria depositar R$ 1 mil na conta corrente nº 8656-8 da agência 4447-4 do Banco do Brasil, mantida em nome de César Assis Recalde. A agência está localizada na avenida Duque de Caxias, 1.628, dentro da sede do Comando Militar do Oeste, em Campo Grande (MS). Caso o depósito tivesse sido feito na tarde de sexta-feira, a entrega ocorreria antes do final do mês. “Se eu der entrada hoje no teu serviço, dia 21 ele sai daqui e 28 tá aí”, garantiu.
Conversa com o negociante de diplomas
Repórter - Alô! Quem fala? É Gustavo?
Gustavo - É...
Repórter - Ah, então tá... Eu queria ver contigo como funciona e como a gente pode fazer isso, porque a grana eu tenho, mas eu queria ter a certeza de que é realmente igual ao daqui. Esse diploma é o mesmo, é o original ou é uma falsificação?
Gustavo - Não, não, é quente mesmo; tem até o R.A.
Repórter - Eu não sei, nunca tive na universidade, não sei o que é RA.
Gustavo - É o Registro Acadêmico. Só pra você ter uma idéia, quando você pega um diploma no nome de outra pessoa, compra só um pedaço de papel, porque sem o Registro Acadêmico isso é falso. Com o teu R.A. você pode ligar lá na faculdade e teu nome vai estar lá.
Repórter - Fica lá dentro então?
Gustavo - É, fica. Caso contrário você estaria comprando só um pedaço de papel.
Repórter - Então quer dizer que dentro da universidade vai ficar um registro?
Gustavo - Claro! Com este R.A. é só ligar lá que vão estar todos os seus dados.
Repórter - E no MEC, fica alguma coisa?
Gustavo - A faculdade remete para o MEC e teu registro vai pro MEC.
Repórter - É este mesmo colaborador que vai fazer o diploma que vai fazer isso?
Gustavo - Exatamente. Porque não adianta você ter o R.A. e tudo e não ter nada no MEC, pois amanhã ou depois se você precisar fazer uma OAB não vai poder. Com este você pode com toda a certeza.
Repórter - Então não vai dar problema mais adiante?
Gustavo - Não, de jeito nenhum.

Denúncia
O excelente trabalho jornalístico do repórter Álvaro Guimarães não pode ser jogado na lata do lixo. O Diário Popular tem toda a chance do mundo de mostrar se houve ou não fraude dentro da UFPel - além de apresentar à comunidade pelotense aquilo que se passa na intimidade da Universidade - e só não o fará se houver uma determinação expressa da diretoria do jornal. Naturalmente, pela gravidade do assunto, ficará fácil avaliar a relevância que o jornal dará a ele: basta acompanhar o noticiário. Se o tema sair da pauta, ficará evidente a intervenção.

Maledicências
Aliás, dizem as péssimas línguas que está em curso uma parceria entre um importante integrante da UFPel e um conhecido personagem pelotense - atualmente ligado à imprensa local - na criação de uma agência de publicidade ou coisa que o valha. Se isso de fato acontecer, Pelotas vai virar um mar de rosas com céu de brigadeiro. Basta ficar atento às novidades.

Ministério Público
Resta ao Ministério Público de Pelotas investigar a fundo a denúncia publicada no Diário Popular. Esclarecer de vez essa questão é ponto de honra para uma cidade que tem na cultura seu patrimônio maior. Desvendar os mistérios de tantas denúncias de fraudes, irregularidades e desmandos numa universidade bancada pelos cidadãos brasileiros é o mínimo que um Ministério Público decente pode - e deve - fazer.


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