terça-feira, 5 de junho de 2007

E a prefeitura de Pelotas teve de sentar no banquinho...

A notícia não está no site da Prefeitura de Pelotas. Também não está no site do Diário Popular. Mas pode ser encontrada na Internet com facilidade nos sites da Justiça Federal. Entenda o caso: a União bloqueou todas as verbas destinadas ao município de Pelotas porque a Prefeitura repassou uma verba do governo federal ao CDL para a realização da Fenadoce, e o CDL não prestou contas adequadamente. Entenda também que ao suspender a liminar interposta pela Prefeitura, o juiz federal Cristiano Bauer Sica Diniz não entrou no mérito da prestação adequada de contas, mas sim da inscrição da Prefeitura no SIAFI. Ou seja: apesar de ter saído do sufoco momentaneamente e de correr o risco de ter os repasses federais suspensos, a Prefeitura e o CDL ainda devem mostrar o que foi feito da verba repassada. Adequadamente. Veja a Ação Ordinária e o despacho do juiz. Ou seja: o prefeito Fetter Júnior teve de se explicar no banquinho da Justiça Federal.


AÇÃO ORDINÁRIA (PROCEDIMENTO COMUM ORDINÁRIO) Nº 2007.71.10.002532-7/RS
AUTOR : MUNICIPIO DE PELOTAS
ADVOGADO : DANIELA BALZ OTTO
RÉU : UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
Despacho/Decisão
Trata-se de analisar pedido liminar do Município de Pelotas, em ação ajuizada contra a União, pelo qual o requerente postula seja imediatamente suspensa sua inscrição junto ao SIAFI, a fim de permitir o repasse de verbas federais e a realização de operações de crédito, bem como proibida a retenção de verbas destinadas às ações de assistência social, saúde e educação, conforme previsão da Lei Complementar 101/2000.
Alega: (a) que o art. 26, caput, da Lei 10.522/02, suspendeu quaisquer restrições à transferência de recursos federais a Municípios inscritos no SIAFI; (b) que a Lei Complementar 101/2000, no seu art. 25, § 3º, também veda expressamente a suspensão do repasse de recursos voluntários destinados às ações de assistência social, educação e saúde (c) que é vedada a inscrição no SIAFI quando a conduta geradora da inscrição foi causada por administrador público que antecede o atual; (d) que a inscrição não foi procedida do devido processo legal, afigurando-se, por isso, ilegítima; (e) que, ademais, atenta contra o princípio da continuidade do serviço público e malfere o princípio da proporcionalidade; (f) que a inscrição no SIAFI originou-se da não prestação de contas pelo CDL - Câmara de Dirigentes Lojistas, referente a valores repassados pelo Município, que haviam, a seu turno, sido obtidos mediante convênio firmado entre este e a União.
A União, intimada a se manifestar sobre o pedido liminar, sustentou, preliminarmente, a ausência de interesse processual, ao argumento de que basta ao requerente efetivar a devida prestação de contas, sendo desnecessário o ajuizamento da ação judicial. Pertinente ao mérito disse ser legítima a inscrição no SIAFI, a qual observou o devido processo legal e encontra respaldo na Lei de Responsabilidade Fiscal. Registrou, entretanto, que não ocorreu a suspensão no que se refere às transferências voluntárias destinadas a ações de assistência social, saúde e educação, nos termos do § 3º da Lei Complementar 101/2000. Disse que, com fulcro no § 2º do art. 5º da Instrução Normativa/STN 01/97, poderia o Município, administrativamente, ter obtido a suspensão da inadimplência.

Passo a decidir.
A preliminar é improcedente e deve desde logo ser afastada. Note-se que não está em discussão, na presente ação, o cumprimento do dever previsto no art. 51, § 1º, da Lei Complementar 101/2000. No caso em tela, o Município inclusive prestou contas, as quais foram consideradas insuficientes pela Administração Federal. O que está efetivamente em discussão é a legalidade da inscrição no SIAFI, bem como as conseqüências daí decorrentes, matéria em relação a qual está devidamente caracterizada a pretensão resistida e, por conseguinte, a existência de interesse processual.
Afasto, assim, a preliminar.
Há, todavia, falta de interesse de agir relativamente ao pedido contido no item 'b' do requerimento inicial, uma vez que o repasse ao Município das transferências voluntárias destinadas às ações de assistência social, saúde e educação, conforme foi afirmado pela União e encontra-se expressamente previsto no § 3º do art. 25 da Lei 101/00, não se encontra suspenso.
E mesmo em relação ao repasse de receitas arrecadadas pela União e pertencentes ao Município, também há em parte falta de interesse de agir, uma vez que também a Lei 10.522/02, em seu art. 26, prevê a impossibilidade de suspensão dos repasses quando destinadas a 'ações sociais'.
Assim, o interesse do Município reduz-se a suspensão da inscrição no SIAFI para que possa, a uma, efetuar as operações de créditos referidas nos autos e, a duas, obter o repasse de verbas a que faz jus, por força da repartição de receitas tributárias previstas na Constituição Federal, que não se destinem à aplicação em ações sociais.
Pois bem, vislumbro a pertinência de alguns dos fundamentos perfilados pelo Município de Pelotas.
Conforme se verifica pela análise dos autos, o Município foi inscrito no SIAFI tendo em vista não ter cumprido com seu dever de prestar contas quanto a verbas recebidas por força do Convênio 38/2004, que totalizaram o montante de R$ 48.000,00.
Não se discute a existência e a importância do dever legal de prestar contas, instrumento essencial à transparência e moralidade no manejo de verbas públicas. Tampouco parece passível de discussão a responsabilidade do Município pelo pagamento dos valores recebidos cuja utilização não ficou devidamente comprovada. Na medida em que formalizou convênio, cabia ao Município cumprir as normas dele decorrentes, pouco importando que a verba obtida tenha sido integralmente repassada ao CDL local.
Também não verifico a existência de violação ao devido processo legal. No caso em tela, foi observado o procedimento previsto na Instrução Normativa/STN 01/91, conforme sinalizam os documentos das fls. 32 e 58, havendo sido devidamente oportunizado ao Município o cumprimento de sua obrigação ou o pagamento dos valores cuja utilização não foi demonstrada.
Tenho, todavia, que obstaculizar que o Município realize as operações de crédito demonstradas pelos documentos que acompanharam a inicial, num valor aproximado de R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais), em virtude da não prestação de contas referente a dívida de cerca de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), caracteriza flagrante violação ao princípio da proporcionalidade, mormente quando a obtenção do referido empréstimo mostra-se de fundamental importância para as finanças municipais e, por conseguinte, para a melhoria dos serviços públicos prestados à comunidade pelotense.
Ademais, como reconhece a própria União, a Instrução Normativa/STN 01/97 admite que o administrador não faltoso obtenha a suspensão da inadimplência por ato expresso do ordenador de despesas do órgão concedente, o que corrobora a assertiva contida na inicial de que o atual Prefeito de Pelotas não pode sofrer os efeitos de conduta perpetrada pelo Prefeito que lhe antecedeu.
O risco de dano irreparável, a seu turno, decorre da própria natureza da pretensão deduzida, ficando cristalizado em face das operações de crédito já autorizadas em favor do Município, mas não implementadas exatamente por força da inscrição no SIAFI.
Isto posto, defiro a liminar, para determinar à União que adote as providências cabíveis para suspender os efeitos da inscrição SIAFI nº 501078, originada do Convênio 38/2004, relativamente ao Município de Pelotas.
Intimem-se.
Cite-se.
Pelotas, 01 de junho de 2007.
Cristiano Bauer Sica Diniz
Juiz Federal

Um comentário:

Anônimo disse...

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