terça-feira, 13 de março de 2007

Bestial

Torcedores arrancaram um vaso sanitário de um dos banheiros do estádio do Santos Futebol Clube e jogaram sobre a arquibancada durante a partida contra o São Paulo, no último domingo. Por sorte, ninguém saiu ferido, mas a audácia ocorreu mesmo com a vigilância de policiais militares encarregados de proporcionar segurança a torcedores não tão bárbaros.

Falha
É certo que alguns intercomunicadores falharam porque as baterias terminaram antes mesmo do primeiro tempo da partida, mas isso não serve de desculpa para que nenhum policial tenha visto toda a ação. Faça o teste: tente retirar um vaso sanitário do banheiro de casa e transportá-lo até a rua. Certamente algum vizinho irá estranhar a cena.

Idéia
Intrigante, porém é a sugestão do comando da Polícia Militar de Santos: a partir de agora, seria bom retirar os vasos sanitários restantes dos banheiros destinados aos torcedores. A idéia, de pronto, foi aceita pela diretoria do clube. A conclusão que consigo chegar é de que boas idéias são contagiantes.

Excelente idéia

Imaginar a lógica que moveu o comando da Polícia Militar santista é um exercício infinito. Ora, se o problema dessa violência é o vaso sanitário, que se acabe com ele, então. Da mesma forma que, se num acesso de raiva, os torcedores arrancarem um portão, que se acabe com o portão. Ou, se existem gatunos para bater carteiras, que se acabem com as carteiras. E por aí afora.

Polícia, para que precisa?
Essa atitude folclórica da Polícia Militar paulista é parte integrante de um raciocínio mambembe sobre segurança pública que está inserido na corporação. Ou seja, é melhor decepar os dedos para que não se roubem os anéis.

Comodismo
A esquizofrenia entre interpretar o que é ação vigorosa dentro dos limites restritos da lei e ações que fogem a esse preceito impedem atitudes que garantam, de fato, a segurança seja lá onde for. Na prática, esse blá, blá, blá corresponde a interagir com a marginália em igualdade de condições. Para, ao menos, devolver o respeito aos homens da lei. E escapar da velha máxima do comodismo, aplicada com todos os seus contornos e mesclada com uma corrupção incomparável na maioria dos estabelecimentos policiais do país.

Chororô
Culpar a estrutura policial também é de uma falta de imaginação irremediável para a falta de inteligência. E, para potencializar a falta dessa, a mais desabrida corrupção. A qualidade primordial - e a que mais falta - à polícia como um todo é a incorruptibilidade. Esse ingrediente supre todas as deficiências policiais.

Ora vejamos
É notoriamente sabido que existem pontos de tráfico com endereço e CEP por qualquer criancinha em qualquer ponto do país. Toma-se alguma atitude? Evidentemente que não. Em São José do Rio Preto, em Santo André e em Pelotas, por exemplo, existem verdadeiros shoppings que comercializam produtos piratas e sem qualquer procedência sob a luz do sol. Milhares de consumidores frequentam esses locais sem que a polícia faça seu trabalho. Aliás, em Pelotas, a Polícia Federal observa a movimentação do shopping das janelas de seu prédio, que fica do outro lado da rua. Algum policial vê alguma coisa?

Ou seja
A polícia não faz o básico. E, portanto, deixou crescer um esquema que hoje tem conexões muito mais intensas e duradouras com personagens que têm influência muito grande na sociedade. Imaginar que vereadores possam ser contra os camelôs irregulares é uma utopia. Imaginar que o tráfico de drogas é feito a partir de pés-de-chinelo é um ultraje ao cidadão, sempre à mercê de balas perdidas. Tem gente grande na linha.

Censor
Em Pelotas, elementos que trabalham em delegacias escondem deliberadamente boletins de ocorrência a fim de que a imprensa não tenha acesso a eles. Atitude estranha, avessa à origem do boletim de ocorrência, que é um documento de pesquisa pública e de acesso ilimitado por qualquer cidadão. A visão desses elementos é clara dentro de sua embaçada concepção de público e privado: a decisão do que se publica pertence a nós (eles, é claro).

Não Publicar
Não bastasse essa excrescência de poder não outorgado, um carimbo com a inscrição Não Publicar é batido contra o boletim de ocorrência, como um alerta e uma determinação aos boletins que se salvaram da censura prévia. Quem duvidar, compareça a qualquer delegacia de Pelotas ou à sede do Diário Popular. Exemplos não faltarão.

Pior
É claro que os boletins que se podem publicar têm ocorrências que envolvem o velho tripé preto, pobre e analfabeto. A estes, qualquer exposição é pouco. Quando um vereador é acusado pela própria mulher de agredi-la, é certo o carimbo no boletim. Da mesma forma quando pessoas ou entidades de certa relevância na cidade estão, mesmo que indiretamente, envolvidas em situações policiais. Exemplo: roubaram armários de dentro da Universidade Católica de Pelotas. No boletim, o carimbão: Não Publicar.

Liberdade de Imprensa
Ora, a imprensa livre não pode se sujeitar a esses desmandos ilegais. Delegar a esses elementos o que pode ou não pode ser publicado é conceder um poder censorial que já se mostrou, em outras épocas, tão nefasto para com a democracia.

Publicação
A publicação dos tais boletins de ocorrência é livre. A responsabilidade por estas publicações é daquele que as publica. É assim em qualquer país civilizado, e é assim no Brasil também. Qualquer atitude em contrário é uma afronta aos direitos mais básicos de informação.

3 comentários:

Fabrício Tavares disse...

Meu caro, com todo o meu respeito a liberdade de expressão, e isso é um bem precioso que temos em tempos de "democracia", lhe pergunto se faz parte do que você e a classe jornalística camam de Liberdade de Imprensa a violação do direito ao anonimato daquele que comete um delito em maior ou menor grau. Em outras palavras, lhe pergunto: o que você pensa sobre a exposição, por exemplo, nos Telejornais...

Fabrício Tavares disse...

de rostos e corpos dos marginais de nossa sociedade, criminosos ou não, poderíamos deles dizer os homens "de mal", a figurar como uma prática corriqueira e normalizada em nome daquilo que chamam a Liberdade de Imprensa? Não estaría a imprensa, aí, condenando duplamente os infratores, junto à justiça, e em nome da "liberdade", por deflagrar a sua imagem em praça pública?

Fabrício Tavares disse...

Me parece que a classe jornalística deveria tentar entender melhor àquilo que nomeia como "libedade", e não confundir Liberdade de Expressão com Liberdade de Imprensa.